quarta-feira, 22 de junho de 2011

Yuck Loja de Departamentos


Prioridades alcançam tons efêmeros quando estamos dentro de uma loja de departamentos. Diferente do que falam quando vamos ao supermercado – “jamais o faça com fome” –, o embate de se distrair com coisas de naturezas tão peculiares num mesmo lugar e hora mostra a mais complexa capacidade do ser humano de desprendimento do essencial.

É assim que eu vejo o Yuck, banda cujos integrantes japoneses, ingleses e estadunidenses se apresentaram no Puma Social, festa fechada destinada à gente bonita e descolada de São Paulo – como eu ganhei o convite numa promoção, então, não sou ambas, apenas um abençoado pelos Deuses do rock.
A banda nada mais é do que um cupom de créditos da Mesbla que recebemos no procedimento de troca daqueles presentes ruins da nossa festa de aniversário, que, quando entregue, gera uma ansiedade que massageia o coração na esperança de satisfazer nossos anseios, seja lá o grau de temporalidade que eles tenham.

A versatilidade do Yuck começa quando abrem o show com “Holing Out”, um power-pop que poderia constar nos melhores álbuns do Superchunk. “The Wall”, cantada por Daniel Blumberg– um rapaz magro, de cabelos esgarçados e corcunda –, sugere Jesus and Mary Chain em Darklands. Logo depois, “Shook Down”, uma melodia de refrão repetido que soa como Teenage Fanclub, deixa passagem livre para “Georgia” com backing vocais femininos que lembram o twee Camera Obscura, e a seguinte, “Suicide Policeman”, um Belle and Sebastian animadinho. A canção mais autêntica, “Get Away”, foi o estandarte do potencial da banda.


Aos 45 minutos de show, com pedais pisados e uns olhares para o técnico de som, as guitarras ganham mais distorção, preparando a entrada de "Rubber", um shoegaze/dream-pop que faz boa parte dos agitados se concentrarem, fecharem os olhos e entrarem em introspecção. Foram 10 minutos de êxtase saindo das caixas de som quase estourando. Então, subitamente, eles mandam tchaus com as mãos e fogem do palco, o que deixou muitas pessoas chateadas. Ainda faltavam músicas boas a serem tocadas, com “Stutter”, mas esta não fazia parte do setlist do pocket-show, desanimando a ponto de recordar 1998, o ano que minha mãe, por livre e espontânea pressão, me fez usar o cupom de créditos num processador/liquidificador Walita.


segunda-feira, 28 de junho de 2010

HIGHLANDS - parte I


Série dedicada a shows de bandas escocesas


Sabe quando você pensa ter engolido uma menina de doze anos, e ela vira, se remexe e brinca com as borboletas adormecidas dentro do seu estômago, fazendo sentir espasmos e cutucando com vara curta o coração? Independente da resposta, essa menina é real e se faz presente sobre a musicalidade da banda Camera Obscura.

Desmascaradora de toda hipocrisia e joguinhos de sedução, ela consegue com letras ingênuas e melodias suaves projetar amores joviais na cabeça dos mais céticos e pessimistas – característica essencial do gênero Twee. A vocalista Tracyanne Campbell faz de você o personagem principal do filme ABC do Amor em menos de uma música, e gera, com um simples “Hello! We’re Camera Obscura and we’re happy to be here in Brazil”, urros de felicidade e atenção plena daqueles confortavelmente ambientados no Studio SP, no dia 26 de maio.

O show começa com My Maudlin Career que também é o nome do último álbum do grupo, um dos melhores de 2009. A música à primeira vista trata de uma paixonite que acabou, nada extraordinária, mas relevante para mudar o rumo de uma vida. Por mais que seja algo fugaz, aceita-se o passado e dignifica a tristeza de um pós-relacionamento, levando a perder completamente a fé nos sentimentos.

Uma bela estratégia usada pela banda: a desconstrução do amor. Esvaziar para depois colorir. O restante do show foi uma coleção de músicas que iluminaram o sorriso do público. Hits como French Navy, The Sweetest Thing, Lloyd..., If Looks Could Kill preencheram o que haveria de ser completado. Interrompendo a execução de uma delas, os membros da banda riam de um telão com efeitos visuais simulando eles próprios tocando no espaço. Ali foi construída uma atmosfera de descontração que jamais vi numa apresentação. Era impossível não sorrir junto. A menina brincava ali dentro.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Lucidez no Rock Nacional

Enquanto o químico Albert Hoffmann pedalava para casa durante a primeira viagem de LSD da história, ele fantasiava muita coisa em meio às distorções visuais, sintomas de paralisia e vontade de rir, porém jamais imaginaria o quanto influenciaria o mundo. Décadas depois, uns ciclistas da classe média porto alegrense conseguiriam homenageá-lo simpaticamente com um videoclipe.



“A competência da banda Pública em fazer ótimos vídeos” foi a maneira como os apresentadores e anfitriões do programa Loaded conseguiram introduzir o grupo gaúcho ao palco da Megastore Saraiva do Shopping Morumbi, no dia 24 de abril. Sons e imagens tão palatáveis que nos indagam por que eles não estão em canais abertos, em cartazes em lojas de CDs, dando entrevistas à Marília Gabriela e outras que soam piegas no consciente do artista independente. No entrevistão do site cultural Scream and Yell, o compositor Rômulo Fróes incentiva os músicos que invistam nesse lado pop, de querer ser reconhecido, de explorar os meios de comunicações assim como eles os exploram.

Depois de uma hora de pocket show, da qual toda a atenção é centralizada nas notas e sons, e da impossibilidade de se distrair com idas ao bar, necessidade de ir ao toalete ou de trocar olhares, é inteligível que o Pública permaneça no cenário independente. Num imaginário que já contava com dois discos absurdos – Polaris (2006) e Como num filme sem um fim (2009) – e com videoclipes premiados e criativos, o mini show "redondo" só fez levar ao consciente o que deveria ser notório e bem esclarecedor: o Pública transita de bicicleta por uma realidade que não é a do ser independente, e pode muito bem ser comercializado além das rédeas desse empreendedorismo sem barato.

Para tirar suas próprias conclusões do show: http://loaded-e-zine.podomatic.com/player/web/2010-05-06T03_37_45-07_00

segunda-feira, 15 de março de 2010

Samba para Carioca Sentar.

Na década de 30, o Brasil sofreu com a rivalidade política de dois importantes vizinhos. A delegação de São Paulo – estado que crescia financeiramente a partir de sua industrialização – fora banida de participar da primeira copa do mundo por fazer frente com a política do Palácio do Catete – antiga presidência –, no Rio de Janeiro. Dois anos depois, houve o que os cariocas chamam de Guerra Paulista e que os paulistas chamam de Revolução Constitucionalista, uma tentativa frustrada de acabar com a autonomia política de Vargas. Dessa briga, porém, nunca haviam feito tanto desprestígio nacional quanto ter chamado São Paulo de o estado que não sabe sambar.

Hoje, o Rio só se vangloria dos artistas de sua MPB. Nem mais presidência é, e sem contar com o efeito pobreza: favelas, drogas, crimes etc. Se por algum acaso ele vir a perder esse título majestoso, temo pela situação de sua população.

Todavia, no Museu de Imagem e Som da capital paulista, na marcante data 6 de março de 2010, que a discussão sobre a atual musicalidade brasileira autêntica se tornou complexa novamente, o que agravou uma surginda rivalidade política musical.

Não é de agora que a banda paulistana Hurtmold vem comendo pelas beiradas: algumas vinhetas das rádios e MTV, trechos de músicas naquele filminho nacional meio estranho e naquela reportagem especial do Fantástico; você apenas pensa que nunca os escutou. Seu samba não é cantado e tem um pé cravado no post-rock de bandas experimentais como o Tortoise. Seus integrantes concentrados nos instrumentos não esboçam sorrisos como os da trupe da Orquestra Imperial, mas a importância é equiparada pela qualidade.

Algumas músicas novas – do tão aguardado lançamento do ano – são apresentadas na primeira parte do show. Elas aparentam ser mais animadas do que as tradicionais e se entrelaçam maravilhosamente nas improvisações que fluem vagarosamente até as canções antigas. Quando surge Bulawayo ou outra música mais conhecida como Olvécio e Bica ou Halijascar, sente-se o arrepiar dos cabelos, o impulso de tocar aquele instrumento imaginário e até mesmo de levantar para sambar miudinho. Mas esse show não é para isso. É show que virá a revolucionar a MPB, o meu primeiro de muitos.

quinta-feira, 4 de março de 2010

O Show que não deveria acontecer


Amanheci com uma câimbra na perna esquerda, meu sanduíche de doze reais estava ressecado e ficamos enclausurados por quarenta minutos no túnel Ayrton Senna antes do show. Nada no dia 2 de março foi além do ordinário, nem mesmo o tão aguardado Coldplay.

De um lado aqueles que me perguntavam: "Já comprou o ingresso? Quanto ta?" E no time rival: “Sabe como eu sei que tu és gay? (fazendo referência ao filme Virgem de 40 Anos). Meus sentimentos por Coldplay viajam entre essas duas vertentes da escola de adoração de bandas contemporâneas.

Acompanhar a história de uma banda britânica com potencial, desde o momento de ascenção no Reino Unido até o estrelato com shows de arena e pirotecnia, é coisa rara para mim. Vi o Travis em 2000, o Coldplay em 2001 e o Snow Patrol em 2004; e dentro desse conceito, o único que abraçou o esquema “ser grande” foi o Coldplay.

Dois terços das 65 mil pessoas presentes no Morumbi estavam descontentes com o volume do som que emanavam apenas das caixas ao lado do palco, fazendo o povo do fundão que não quer se misturar e os riquinhos que esbanjam dinheiro com arquibancadas não escutarem o show dignamente.

Outro motivo para sair sem entusiasmo do show foi ver o quão fácil foi esculachar com músicas legais. Afora os comentários sobre as do novo álbum Viva La Vida - que não merecem nem uma linha -, The Hardest Part ficou desanimada e o pout-pourri de canções tão distintas como God Put a Smile Upon your Face e Talk foi um erro de principiante. Sem contar que quando o grupo apareceu num segundo palco, no meio da multidão, para um set acústico, nem mesmo Shiver foi capaz abafar ou cessar as conversas permanentes ao meu redor, o que me impossibilitou de escutá-la direito.

Nem tudo foi lástima. A banda exageradamente simpática cantou em português “Parabéns a Você” ao seu líder que completava 33 anos. No repertório, um começo avassalador, mas aí foi diluindo, ficando sem fôlego musical, escolhas erradas somadas ao som ruim. O bis trouxe emoção, mas ninguém tinha "pernas" para aquilo.

Confesso que gostei quando borboletas de papel colorido voaram em Lovers in Japan e The Scientist - que não precisa de nada para ser bonita. Até pintar, novamente, aquele corinho asqueroso de Viva La Vida que me fez lembrar de quando Chris Martin anunciara o fim da banda caso A Rush of Blood to the Head não fosse tão bom ou melhor que Parachutes. Nesse caso, eu não vi o Coldplay tocar ontem.


SETLIST: Life In Technicolor, Violet Hill, Clocks, In My Place, Yellow, Glass Of Water, 42, Fix You, Strawberry Swing, God Put A Smile Upon Your Face/ Talk, The Hardest Part, Postcards From Far Away, Viva La Vida. Lost!, ShiverParabéns para você/Happy Birthday, Death Will Never Conquer, Don Quixote, Viva La Vida (remix), encore: Politik, Lovers In Japan, Death And All His Friends, encore II: The Scientist, Life in Technicolor 2, The Escapist.

domingo, 10 de janeiro de 2010

Melhores Álbuns 2009

Uma pausa dos shows por um bom motivo.
Agora que eu tenho um blog sobre música, não vai soar nem um pouco pretensioso se eu fizer um ranking dos lançamentos do ano e da década.

Melhores de 2009


The Twilight Sad – Forget the Night Ahead
Não vou nem comentar o fato de ter assistido dois shows fodas do grupo no ano. A questão que vale ressaltar é que o álbum é um assassinato calculado. Não é de todo agitado, porém muito vibrante. Um amigo o definiu como Interpol de homem. Eu prefiro achar que é shoegaze para gente que cansou de olhar só para os sapatos.



The XX – idem
Álbum redondo. Um som perfeito mesmo sem contar com baterista na banda. Falsetes, vozes sussurrantes, cantos masculino e feminino intercalados que encaixam perfeitamente nas letras de relacionamentos. Islands é, sem dúvida, a Young Folks deste ano.


Gomez – A New Tide
Conheço esta banda há algum tempo, porém jamais dei muita atenção a ela. Talvez por ter três vocalistas a banda soasse sem identidade. Este álbum, porém, evidencia a beleza da música pop, e prova inteligência de comportar ótimos músicos em apenas uma formação.


Boston Spaceships – Zero to 99
Banda da pessoa mais hiperativa do cenário alternativo estadunidense, o Robert Pollard, que de vez em quando sofre de saudade patológica da sua ex-banda Guided by Voices e tem mania de transmitir esse “mal” com a alcunha de Boston Spaceships. Um de seus 4 trabalhos lançados em 2009 me contaminou.


Doves – Kigdom of Rust
Você precisa ser inglês para poder entender um inglês. O álbum trata dessa máxima. O que surpreende é que mesmo com Viva La Vida, o Coldplay seja considerado "mais banda" do que Doves. A fama é um negócio difícil de entender. Noutros quesitos como musicalidade e não-possuir-um-vocalista-chato-de-galocha, Doves assume uma notável vantagem.

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Primeiro dia no paraíso


Mais ou menos 3 horas depois do meu desembarque, a única coisa que me passava pela cabeça tremendo de frio fazia parte de uma música do New Radiant Storm King que conseguia resumir um pouco da epopéia que foi o dia 11 de abril: “I remember getting lost in Boston, it was the worst city I’d ever seen”.

Ajudado por senhoras caucasianas e por uma alma brasileira caridosa – do quase xará Stefani – consegui chegar sem ter meus dedos do pé amputados devido à longa caminhada sob chuva e rajadas de vento gelado. Bastaria comer uma pizza de micro-ondas, sossegar durante 4 horas e, então, partiria para algum show.

Embora ainda faminto, apenas um dos dois especiais do dia me seria ofertado. A primeira opção do cardápio era uma combinação de comida refinada da terra. De primo piatto Crooked Fingers à base de Eric Bachmann, ex-líder do Archers of Loaf, e de secondo piatto, a suculenta proposta folk-rock da canadense, ex-The New Pornographers, Neko Case.

De segunda opção, a autêntica comida americana. Appetizers insossos de Mic Harrison & The Highscore velho e requentado, seguido por uma taça de milk-shake de baixa caloria para uma nova geração obesa de Cassavettes e outras repetições. Até que, finalmente, algo digno de entupir as veias, o original hot-dog gorduroso e recheado de sabor Superdrag.

O fato de escolher a segunda foi estudado. Em menos de um mês eu assistira Radiohead e Kiss, dois espetáculos de arena, e agora estaria na hora de ver uma banda retardada, que sua e cospe, enquanto bate cabeça e dá braçadas impiedosas na guitarra. É esta recordação que eu terei deste show, de gente comum dos Estados Unidos como John Davis – líder da banda e aniversariante do dia (veja-o recebendo o bolo ao lado) – que está pouco ligando para fase atual do rock.

Outra recordação recorrente é dos integrantes da banda vestidos de funcionários de uma cafeteria ou mesmo daquelas lanchonetes que imitam os anos 50, com grandes cabines de refeições e poltronas estofadas. É o clipe da música Sucked Out que percorreu a programação de uma MTV atacada por bandas como Guided by Voices, Radish e Buffalo Tom no meio da década de 90. Programas como Gás Total – apresentado por Gastão Moreira - exibiam o que mais tinha de palatável na época.

Em meio a todo saudosismo declarado pela banda, não agüentava a intermitente câimbra que impossibilitava manter-me de pé. Espontâneos e agradecidos, citaram o Paradise Rock Club – o único lugar a frescar com o meu passaporte – como um dos pilares dos 15 anos de carreira da banda. Um lugar bem parecido estruturalmente com o Centro Cultural Cidade Velha – antiga Sarajevo – que dentro dos padrões das casas modernas, traria à Boston os mais cultuados pratos da cultura americana. No trajeto de volta ao subúrbio, eu pensava em devorar a cidade viva, sem talheres e com a mesma voracidade que os músicos laricados atacaram aquele bolo de aniversário. Era meu primeiro dia.

Link para algo bem parecido: http://www.youtube.com/watch?v=1XhcdUUWQFs